Há cortes e “cortes” nas pensões!

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As pensões dos reformados têm sido um alvo privilegiado dos governos, sempre que uma crise económica afecta a sua governação. Num passado próximo, em 2011, Sócrates criou uma contribuição extraordinária de solidariedade no valor de 10% para as pensões acima de 5000 euros e o “congelamento” das restantes pensões.

Depois da assinatura em Maio, pelo Governo Sócrates, do “Memorando da troika” – que previa cortes nas pensões acima de 1500 euros, para uma poupança de pelo menos 445 milhões de euros –, no mês de Outubro foi aprovado, pelo Governo de Passos Coelho, o Orçamento de Estado para 2012 (Lei n.º 64-B/2011) em cujo artigo 20.º, n.º 15, se pode ler: “As pensões, subvenções e outras prestações pecuniárias de idêntica natureza, pagas a um único titular, são sujeitas a uma contribuição extraordinária de solidariedade, nos seguintes termos: a) 25 % sobre o montante que exceda 12 vezes o valor do indexante dos apoios sociais (IAS) ou seja, 5030.64 euros, mas que não ultrapasse 18 vezes aquele valor; b) 50 % sobre o montante que ultrapasse 18 vezes o IAS, ou seja 7545,96 euros.

Nesse mesmo mês foram anunciados cortes nos subsídios de férias e de Natal para os pensionistas que auferissem mais de 1100 euros de pensão. Apesar do Tribunal Constitucional ter considerado inconstitucional este corte, o mesmo Tribunal deliberou que “essa suspensão ou redução se mantém plenamente válida no ano de 2012”.

No Orçamento para 2013 (Lei nº 66-B/2012) foi anunciado o corte de subsídio de natal e férias para os pensionistas com pensões superiores a 1100 euros, corte chumbado pelo Tribunal Constitucional. Ainda no Orçamento de 2013 foi definida a aplicação de uma Contribuição Extraordinária de Solidariedade às pensões a partir de 1350 €, até às pensões de 3750 €, perfazendo uma taxa global que variava entre 3,5% e 10%. Às pensões acima de 7545,96 foi aplicada uma contribuição de 40%. Ainda em 2013, o Governo de Passos Coelho tentou aplicar um corte de 10% a todas as pensões acima de 600 euros ilíquidos, corte esse chumbado pelo Tribunal Constitucional.

Em 2014, nova tentativa para cortar pensões acima de 2000 euros, de novo o Tribunal Constitucional não deixou passar. Ainda alargou a Contribuição Extraordinária de Solidariedade às pensões acima de 1000 euros. Para 2015, propunha novos cortes nas pensões, de forma a conseguir uma poupança definitiva de 600 milhões de euros.

A partir de 2015, já com o Governo do Partido Socialista as pensões foram aumentadas de acordo com a lei vigente, tendo, logo a partir de 2016, havido um aumento extraordinário de dez euros para as pensões mais baixas.

O “corte” a que se refere agora o candidato da AD diz respeito ao que se passou entre 2022 e 2024. Em Outubro de 2022 foi atribuído um complemento excepcional, não previsto, de 50% da pensão, aos pensionistas com pensões até 12 IAS, o que é equivalente a uma actualização de 3,57%/mês. Em Janeiro de 2023, o Governo de António Costa, com o argumento da meia pensão atribuída em Outubro anterior, decretou um aumento abaixo da fórmula legal. Essa medida muito contestada pela APRe! foi parcialmente revertida a partir de Julho com a actualização das pensões em 3,57%, o que, anualizado, dá o valor mensal de 1,79%. Independentemente de tudo o que aconteceu, a base dos aumentos das pensões para 2024, passou a ser a que resultaria da aplicação da fórmula em Janeiro de 2023.

Assim, em 2022 as pensões aumentaram entre 4,57% e 3,81%; em 2023 o aumento foi entre 6,62% e 5,68% e em 2024, entre 6% e 5%. Não fora a actuação do Tribunal Constitucional entre 2011 e 2015 e os cortes das pensões teriam sido brutais e definitivos!

Artigo de opinião de Maria do Rosário Gama, publicado no jornal Público