Opinião

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PORTA-AVIÕES AO FUNDO!
Vou escrever na primeira pessoa do singular. Se acharem que estas linhas traduzem o vosso estado de espírito, sintonizem para a primeira pessoa do plural. Estou tão cansada, tão farta destes governantes manipuladores e destes agentes da política e alta finança estrangeira que nos tratam abaixo de cão. A Europa para mim tornou-se num enorme palco no qual a hipocrisia é o personagem maior. Houve tempos em que a Europa refulgia na minha imaginação; tudo vinha da Europa, as novidades, os debates, a música de intervenção, a agitação intelectual, a democracia e a liberdade. Depois vieram os tempos em que empenhadamente trabalhei com a Europa almejando desenvolvimentos de ordem profissional que nos tirassem da idade das trevas em que nos perdíamos. E depois veio o tempo em que virei costas, passei a não acreditar na Europa, na EU, na malfadada DGXIII. Agora aí estamos às voltas com a Europa, com as visitas regulares da Troika e em particular do FMI que ousam estabelecer metas, confrontar pontos de vista díspares dos pronunciados pelos governantes nacionais, num despique absurdo, uma imitação de clareza, uns e outros a empurrarem-nos para o empobrecimento definitivo. Alguém já perguntou alto e bom som aos representantes do FMI se eles têm solução para as pessoas se alimentarem sem dinheiro? Alguém já lhes perguntou como é que na terra deles se faria se as pessoas tivessem de optar entre comer e pagar a luz, o gás, a água e a renda? Estou tão farta de os ouvir com ar cândido dizer que é impensável não pagar a dívida, a todos, aos nossos governantes e aos emissários estrangeiros; já não aguento mais ouvir alguns dos nossos dirigentes da oposição criticar com ar muito pouco convicto e sentido quer as decisões governamentais quer as troikistas. É tudo um faz de conta. Uns porque querem votos, os outros porque querem mão-de-obra barata para contrapor à chinesa. À medida que as eleições se aproximam, a máscara vai caindo, as posições são de conveniência, a manipulação instala-se e aumenta. As manobras não se confinam aos bastidores. De forma despudorada, tudo se passa na grande praça pública e eu com uma vontade tão grande de descer à rua. Afundaram-se os submarinos, afundou-se o orgulho, afundaram-se as fontes de receita, afundou-se a alegria e a esperança. Ingenuamente, com certeza, nunca equacionei que fosse possível atingir um tal nível de fragilidade mas o que é facto é que aí estamos. Incapazes de reagir, de ter um sonho e lutar por ele. Este país, oitocentos quilómetros a olhar o mar, desorganizado e desarticulado, tanto potencial a submergir. Encontrasse eu muitos mil com a minha zanga e angústia, com convicção, ah, ganharia mais forças para zarpar. Mas porta-aviões ao fundo, nunca.
Maria Luísa Cabral