A aflição das pensões

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Sem compreensão do problema, não pode haver solução

Um dos temas “fracturantes” – como é moda dizer agora – da próxima campanha eleitoral parece ser o “futuro das pensões”, ou seja, a sustentabilidade da Segurança Social. De forma mais concreta, a questão está em saber se conseguiremos, ou não, financiar as pensões nos anos que se aproximam.

Penso que tanto PS como PSD partilham esta aflição e acham, na ausência de um milagre demográfico de nascimentos em catadupa, que as soluções se resumem a aumentos de impostos e cortes das pensões. Pelo meu lado, não me parece boa ideia encontrar soluções para os problemas sem os compreender. E qualquer abordagem que quisermos fazer ao assunto terá, em minha opinião, que partir de uma interrogação inicial: se não há dinheiro para pagar as pensões futuras, isso deve-se a quê? Falta de suporte demográfico (pessoas), falta de dinamização económica (produtividade) ou deficiência de gestão social (organização)?

Para responder à primeira parte da questão, “pordatei-me”. Assim, posso dizer que, em 1980, existia uma população empregada de 4.350 milhares de indivíduos. Em 2014, esse valor é de 4.500 milhares. Projecções demográficas seguras (cenário central do INE) estimam que a população em idade activa será de 4.540 milhares, em 2060, ou seja, daqui a cerca de 50 anos. Deduz-se, então, que não haverá menos gente para trabalhar. Pode argumentar-se: a população em idade activa começa aos 15 anos e é bom que os jovens estudem até aos 20 anos. Muito bem, mas a idade activa só vai até os 65 anos e pode ir até aos 70. Concluamos: apesar do frémito natalista, não me parece que o problema seja demográfico. A dificuldade não está em ter mais pessoas, mas no que sabemos fazer com elas.

Quer dizer que problema é económico? Na superfície, sim. Porque mais gente, com a nossa actual competência económica, apenas iria engrossar o desemprego. Devo, aliás, lembrar que o PIB (a preços constantes em euros) era de 87 mil milhões em 1980 e é quase o dobro em 2014. Usando igual número de empregados. Portanto, a produtividade duplicou. Também poderá duplicar até 2060. Até porque a produtividade portuguesa (medida em PPS) é, hoje, 65% da europeia, quando a Holanda ou a Alemanha apresentam valores de cerca de 130%. E a Noruega mais de 180%. Então, como se aumenta a produtividade? Presumo que com inovação. O que supõe conhecimento, mas, acima de tudo, a existência de uma avaliação verdadeira e objectiva do desempenho profissional. De todos. Tudo coisas que não ouço dizer a ninguém. Deve ser por se tratar de propostas anti-eleitoralistas. Mas pouco percebo de economia. No que estou acompanhado, em bom rigor, pelos economistas que nos trouxeram ao ponto em que nos encontramos. Por isso, acho que devemos procurar gente que tenha estudado muito, e pensado ainda mais, mas que esteja liberta do sistema de compreensão da realidade usado no passado recente. Acho hilariante que a maior parte dos “opinadores” económicos da nossa Comunicação Social sejam ex-ministros da Economia ou das Finanças.

No entanto, penso que a solução económica passa por uma revolução (estrutural) da organização social. E, aí, já tenho uma opinião. Que é simples: é preciso pensar tudo isto de novo. Radicalmente. Ainda continuamos manietados pelo impacto da Revolução Industrial. Porque não estudámos ou pensámos o suficiente. Porque não pensámos de forma sistémica, globalizante. Mantemos, sem reflectir, os comportamentos do passado (por exemplo, as greves que prejudicam os pobres em vez dos ricos). É necessário atingir uma sociedade meritocrática, na qual os tempos de trabalho, de educação e de lazer se misturem, em vez de estarem compartimentados em blocos estanques (o que fará reduzir os “dependentes”, pois muitos dos mais velhos continuarão activos e muitos estudantes trabalharão).

Mas não me vou alongar a este respeito. Apenas direi que quem não sabe resolver o problema tem de procurar quem saiba. Descobrir as propostas de transformação social sérias que já existam. E chamar os mais competentes, os que têm uma visão mais ampla, os que poderão criar essa meritocracia. Embora esta seja a maior das ameaças para os impreparados: como poderão, depois, a continuar a mandar?

Resumindo e concluindo, quando vejo os responsáveis políticos enervados a tentar resolver problemas que não compreendem muito bem, nem sequer sabem se verdadeiramente existem, lembro-me de um filme do Indiana Jones que envolvia nazis que, a meio do filme, faziam grandes fogueiras de livros. Já no final, quando o nosso herói estava quase a desvendar o segredo, que já não sei qual era, surge um símbolo qualquer com uma mensagem que era imperioso interpretar. O nazi que o acompanhava e ameaçava pergunta-lhe: “que é que isso significa?”. Resposta: “significa que vocês deviam ler livros, em vez de os queimar”.

Luís Valente Rosa

Opinião Visão 27.04.2015