Aplicação de verbas do Fundo de Estabilização da Segurança Social (FEFSS)

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O Primeiro Ministro, aliás na sequência do que já constava do Programa Eleitoral do PS e posteriormente no Programa do Governo, afirmou que vão ser aplicados mil e quatrocentos milhões de euros, verba proveniente do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) para a promoção da “reabilitação urbana” e aquisição e reabilitação de imóveis particulares, com vista à criação de emprego e desenvolvimento da economia.

E acrescentou ainda que tal “investimento” corresponderia a uma diversificação das fontes de financiamento da segurança social…

Ora, o FEFSS foi criado em 1989, e é um património autónomo que tem por objectivo assegurar a estabilização financeira da segurança social, contribuindo para o ajustamento do regime financeiro do sistema publico de segurança social às condições económicas, sociais e demográficas.

O FEFSS funciona pois, como um “elemento de capitalização” no “Sistema de Segurança Social (regime “previdencial” ou contributivo), de modo a assegurar a estabilização estrutural do regime financeiro da segurança social. Por isso, o FEFSS deve garantir a capacidade do Sistema de Segurança Social para pagar as pensões durante um período de dois anos, em caso de eventuais e súbitos défices de Tesouraria.

Este elemento de capitalização do sistema previdencial é gerido pelo Instituto de Gestão de Fundos de Capitalização da Segurança Social (IGFCSS.IP). No preâmbulo do seu Regulamento se explicita que “presidiu, pois, à criação daquele Instituto a necessidade de aumentar a utilização de excedentes de tesouraria do regime geral da segurança social no reforço da capitalização pública, em ordem quer à sustentabilidade financeira do sistema quer à prossecução das reformas em curso da segurança social.”

A composição da carteira do FEFSS tem como princípio orientador a maximização do valor dos investimentos, com salvaguarda das condições de estabilidade e liquidez, dentro de um nível de risco desejável.

A sua composição está definida na Portaria nº 1273/2004, de 7 de Outubro, entretanto alterada pela Portaria 216-A/2013, de 2 de Julho, que veio aumentar os valores aplicados em dívida emitida pelo Estado português, (que atingem agora os 57%) em substituição de activos de outros Estados da OCDE. Claro que o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS), na composição da sua carteira, obedece a três regras fundamentais:
  • a) Rentabilidade;
  • b) Segurança;
  • c) Liquidez.
Ora, um Fundo como o da Estabilização da Segurança Social, quer pela sua origem quer pelos seus objectivos, (especificamente o de “assegurar a cobertura das despesas previsíveis com pensões por um período de dois anos”), deve ter uma carteira cujas aplicações sirvam o Fundo seguro, embora rentável, mas também com a liquidez necessária para ocorrer a situações conjunturais desfavoráveis nas receitas do sistema previdencial. Nestas mesmas regras se enquadra a “diversificação” das aplicações.

Daí o nosso receio anterior do que poderia resultar para o mesmo FEFSS da alteração introduzida pelo Portaria nº 216-A/2013, (publicada no Diário da República nº 125, de 2 de Julho) onde refere que aquele Fundo “deve desinvestir em activos de outros Estados da OCDE por contrapartida da aquisição de dívida portuguesa”, aumentando assim o peso da dívida pública daquele Fundo até 90%, (e representando, em finais de 2013, cerca de 58%).

Mas as aplicações financeiras em imóveis têm dois inconvenientes:

  1. não oferecem liquidez;
  2. a longo prazo, trazem mais encargos (obras de reparação e conservação) do que rendimento.
De resto, a capitalização das antigas Caixas de Previdência passou muito pela aplicação em imóveis (alguns de rendas sociais), mas ainda hoje o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social está a vender esses prédios provenientes das aplicações da antiga Federação das Caixas de Previdência.

Ora, também na composição da carteira do FEFSS, se prevê que este pode aplicar o máximo de 10% em imóveis, sendo certo que actualmente o peso do “imobiliário” na carteira do FEFSS, representava em 2013, apenas 1,4%, e devido ao comportamento do mercado imobiliário, o mesmo sofreu uma desvalorização de mais de 4,8% (Conta da Segurança Social de 2013 – Análise do Tribunal de Contas)

Por isso, não parece que esta medida contribua para a maior sustentabilidade financeira do regime contributivo da segurança social, e nem sequer representa nenhuma diversificação da suas fontes de financiamento.

De facto, aquela verba representa uma mera alteração da composição da carteira de investimentos do FEFSS, que é um “fundo de reserva”, e tem como origem do seu financiamento, as contribuições dos trabalhadores, e que não é susbstituída no seu abastecimento futuro por qualquer outro tipo de financiamento (nomeadamente proveniente do capital).

Isto é: o FEFSS ficará não só com menos liquidez, mas também aquele fundo não passa a ter outra “fonte de financiamento” diferente do das cotizações.

Também não é adequado “desviar” para aplicação em investimento de reabilitação urbana, “arrendamento social” ou de outro tipo, verbas que servem o único e legal objectivo do próprio Fundo: o de contribuir para o equilíbrio e sustentabilidade do sistema previdencial da segurança social, assegurando através das reservas acumuladas um montante equivalente ao pagamento de dois anos de pensões.

Claro que não estando a serem retidas às contribuições cobradas, a parcela entre 2% a 4% mensais das quotizações dos trabalhadores por conta de outrem, para reforço deste Fundo (por virtude do aumento das despesas com o desemprego, e à diminuição das contribuições), existe ainda um menor financiamento do mesmo.

Ora, e seguindo ainda os dados constantes da análise do Tribunal de Contas à Conta da Segurança Social de 2013, verifica-se que naquele ano o Fundo estava valorizado em cerca de M€ 11.669 (equivalente a 7% do PIB português), o que daria para pagar apenas 12,2 meses de pensões do regime previdencial (contributivo), ou 9, 1 meses do total das pensões…

O volume de receitas gerado pelo sistema previdencial, e por isso a sustentabilidade do mesmo, depende da capacidade de encontrar as políticas macroeconómicas adequadas para o crescimento económico e de emprego, de modo a assegurar a taxa de substituição da população, em cada geração.

A criação de emprego e o desenvolvimento da economia, não podem por isso ser realizadas à custa do financiamento fácil das reservas actuais e futuras do sistema previdencial da segurança social, antes serão a criação de emprego e o desenvolvimento económico a constituir as bases da garantia da sustentabilidade do sistema público de segurança social, pelo acréscimo das receitas e da produtividade geradas.

António Lopes Dias
Associado APRe! nº1970