Crise aumenta abusos sobre idosos

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ESTUDO Um em cada quatro idosos reporta já ter sido vítima de algum tipo de abuso, principalmente por parte dos cônjuges ou filhos, e a situação de crise económica aumenta o risco de tal acontecer. Este é o resultado de um estudo da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, em parceria com o Instituto de Saúde Pública da mesma academia, que procurou perceber o impacto dos contextos de crise económica e financeira no abuso de idosos.
“Todos os indicadores que captam facetas de uma condição de vida materialmente menos favorável parecem associados à prevalência de abusos”, refere Isabel Dias, coordenadora da investigação que estudou o impacto da última crise económica em Portugal. “Os idosos sujeitos a cenários de privação material estão mais expostos”, alerta a investigadora. E o risco aumenta duas vezes em casos de dificuldade económica ou de privação de medicação, e nove vezes em situação de privação alimentar. Os sintomas depressivos também agravam o risco. “E a existência de um baixo suporte social faz triplicar a probabilidade de ocorrerem abusos”, acrescenta a socióloga, que avisa que os “contextos pandémicos” e de isolamento aumentam o risco de maus-tratos.
ABUSO PSICOLÓGICO NO TOP
O abuso psicológico é o mais recorrente, e afeta 20% dos idosos. Em percentagens mais baixas, surge o abuso financeiro, físico e o sexual. E são os cônjuges os principais responsáveis (28%). “Na população mais velha, a situação de abusos é mais complexa, porque há uma relação afetiva com os cônjuges, companheiros de longa
data, e muitos deles já eram agressores quando o casal era mais jovem. E o ciclo de violência perpetua–se”. São raras as vítimas seniores que pedem ajuda. Mais de dois terços opta por não relatar os incidentes, por pensarem que as autoridades não vão acreditar que são vítimas nesta idade. Apesar de os dados apontarem para cenários de vulnerabilidade, a investigadora garante que a violência contra idosos é transversal em termos sociais. “Mas cada classe maltrata como pode e as estratégias para ocultar são diferenciadas”.
O estudo apela à criação de respostas específicas para idosos vítimas de violência. “Ao nível dos serviços de saúde, serviços sociais, do apoio psicológico, do acolhimento de vítimas”, diz Isabel, deixando um alerta: “Há casas-abrigo para mulheres vítimas, mas os idosos ou são institucionalizados em lares ou ficam nos corredores dos hospitais à espera de uma solução”.
EM NÚMEROS
677 idosos inquiridos, com 60 ou mais anos, todos residentes no Porto. 64% deles vive em conjugalidade. O estudo começou em 2016 e terminou em 2020, com financiamento da FCT.
20% dos agressores são filhos, mais homens que mulheres, embora as mulheres sobressaiam na prevalência do abuso psicológico. Vizinhos, irmãos e cuidadores informais e formais também surgem como agressores.