Falta de profissionais de saúde nos lares coloca idosos em risco

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Estudo acompanhou mais de 1000 idosos de lares de Lisboa durante seis meses e alerta para a necessidade destas entidades terem mais profissionais de saúde.

A falta de profissionais de saúde nos lares coloca os idosos em risco e há sinais disso: quase 20% dos idosos incluídos num estudo da Ordem dos Enfermeiros deram pelo menos uma queda no período de seis meses em que foram analisados e quase 10% tinham as chamadas úlceras de pressão em várias zonas do corpo. Para o enfermeiro António Simões Bala, autor do trabalho, a carência de recursos humanos especializados é ainda mais preocupante já que “99% das pessoas nestas estruturas residenciais para idosos precisam de ajuda para mais do que uma actividade da vida diária e 56% têm uma dependência total”.

O trabalho a que o PÚBLICO teve acesso, conduzido pelo tesoureiro da Secção Regional do Sul da Ordem dos Enfermeiros, responsável pela área dos idosos, contou com uma amostra de 1019 pessoas que residem em 17 lares da região de Lisboa e Vale do Tejo. Os resultados dizem respeito a um período de seis meses do ano de 2014. “Criámos uma equipa de acompanhamento de estruturas residenciais de idosos – a que chamamos lares – e desenvolvemos uma série de visitas a estas unidades e identificámos grandes dificuldades. Existiam falta de cuidados de saúde em termos dos lares, com poucas horas de profissionais de saúde e de enfermagem em particular”, explicou ao PÚBLICO António Simões Bala.

O enfermeiro destaca que estes idosos tinham em média 83,5 anos e viviam quase há cinco anos em lares. Em relação às principais conclusões, sublinha que “destes 1019 idosos, mais de 200 foram a umas urgências hospitalares pelos menos uma vez durante o meio ano”. Além disso, 8,6% das pessoas tinham já úlceras de pressão, sobretudo na chamada região sagrada, a zona inferior das costas, junto ao cóccix. Outros 31,7% de idosos estavam em alto risco de desenvolver estas feridas. Em relação às quedas, António Simões Bala adianta que identificaram que “cerca de 20% dos doentes caíram em seis meses e 2% dos idosos caíram pelo menos duas vezes”, sendo grande partes destes episódios registados logo de manhã.

Para o especialista, o facto de um em cada cinco idosos terem caído é especialmente importante se tivermos em consideração a dificuldade de recuperação nestas idades. “Falta um programa de intervenção urgente na qualidade. Uma queda traz consequências graves do ponto de vista da funcionalidade. Se a pessoa já tem algum nível de dependência e ocorre uma queda com um traumatismo grave ou necessidade por exemplo de uma prótese na anca e de um internamento prolongado a perda de autonomia será ainda maior”, reitera.

António Simões Bala alerta que a situação de dependência dos idosos analisados nestes lares é muito semelhante ao que se encontra na chamada Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, em especial nas unidades da rede dedicadas aos cuidados de longa duração. “Em termos do nível de dependência os idosos das estruturas residenciais estão um pouco abaixo dos cuidados continuados, mas do ponto de vista do défice cognitivo, das demências e da doença cardiovascular os dados são mais elevados”, diz.

Por isso, o enfermeiro defende que as exigências para os lares deveriam ser semelhantes ao que acontece na rede de cuidados continuados. “Na rede está legislado que tem de haver uma equipa de saúde com enfermeiro permanente e nas estruturas residenciais para idosos a legislação é muito parca e fala num enfermeiro para 40 idosos”, explica, dizendo que as regras “também não distinguem o nível de dependência nem da escala que se deve utilizar para classificar os doentes ou as horas que se deve contratualizar com o profissional de enfermagem”.

O autor insiste que “a introdução de um ou dois enfermeiros consegue trazer ganhos substanciais” e defende que os lares deveriam contar com “profissionais mais habilitados que consigam introduzir programas de prevenção, vigilância e acompanhamento” dos idosos. Simões Bala ressalva que os dados podem, quanto muito, pecar por defeito, uma vez que as estruturas analisadas contavam com enfermeiro (mesmo que só parcialmente), sublinhando que há outras que nem isso têm. Sobre os custos, o enfermeiro contrapõe que é preciso “pensar em novos modelos de financiamento” e ter em consideração que se vão evitar outras despesas, como as idas às urgências. “O investimento nas equipas de saúde vai melhorar a qualidade e autonomia das pessoas”, conclui.

Romana Borja-Santos
Público 29.10.15