Há municípios onde o número de lares ilegais detectados duplicou

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A pandemia de covid-19 levou as autarquias a fazer o levantamento de casos em residências de idosos que estão abertas sem qualquer licenciamento. A Segurança Social desaconselha uma acção musculada no fecho de lares, se tiverem boas condições para os utentes.

 
Camilo Soldado (1)

Com a ida das autarquias para o terreno, a lista de lares ilegais sinalizados pelas autoridades tem aumentado. Há concelhos onde essa lista duplicou, como são os casos de Palmela ou Ourém, e em Santarém, que anunciou os dados no final de Maio, o número quase mais do que duplicou, de 17 para 42. A covid-19 veio tornar mais urgente saber onde estão estas casas, quantos idosos lá vivem e em que condições vivem, para garantir a prevenção da doença e actuar nos casos onde já tenha chegado. Os distritos com maior concentração de lares ilegais serão mesmo Setúbal e Santarém. A indicação é de João Ferreira de Almeida, presidente da Associação de Lares e Casas de Repouso de Idosos, entidade que em 2012 fez um levantamento deste tipo de casas. O PÚBLICO questionou concelhos destes distritos e conseguiu respostas de alguns.

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Se, numa situação normal, a sinalização e fiscalização seria da competência da Segurança Social, o estado de emergência motivado pela pandemia levou a que as autarquias fossem envolvidas no trabalho, através das comissões municipais de Protecção Civil, mostra um protocolo de actuação do Instituto da Segurança Social, a que o PÚBLICO teve acesso. O documento refere que deve ser evitada uma “acção musculada” no encerramento dos lares ilegais, caso estes tenham boas condições para os utentes.
A base de trabalho, que envolve também as autoridades locais de saúde e forças de segurança, é uma lista elaborada pelo Instituto de Segurança Social (ISS), com as casas que acolhem idosos sem licenciamento detectadas nos últimos três anos.
“Conhecíamos a dimensão, mas ficámos ainda mais surpreendidos quando fomos para o terreno. De 30 lares que sabíamos que não estavam licenciados, passámos para 68”, começa por ilustrar o presidente da Câmara de Palmela, Álvaro Amaro, ao PÚBLICO. Depois de conhecido o número, uma equipa composta pela Autoridade de Saúde, pela Protecção Civil Municipal e pela Segurança Social está a fazer vistorias aos 68 lares, “um número assustador”, explica o autarca do concelho do distrito de Setúbal, que estima que haja entre 200 a 300 pessoas a viver nessas casas.
Um pouco mais a Norte, já em Santarém, o município de Ourém detectou 20 lares ilegais, embora a lista do ISS que chegou à autarquia fosse composta por 11. “O número ao qual chegámos acaba por não ser muito surpreendente”, diz o presidente de câmara, Luís Albuquerque, acrescentando que ainda estão a fazer cruzamento de dados.
Testes ainda não arrancaram
No levantamento feito em 2012, a Associação de Lares e Casas de Repouso de Idosos, chegou a um número: 3500 lares ilegais em todo o país, o que “foi sempre considerado disparatado”, diz João Ferreira de Almeida. Mas agora, perante os números que têm sido avançados pelas autarquias, até receia que sejam mais. Em resposta ao PÚBLICO, o ISS diz que, “sendo por definição uma actividade ilegal e clandestina, não existe conhecimento do total de equipamentos ilegais a funcionar”. No entanto, acrescenta que “os números apurados estão muito distantes do número divulgado”.
Além dos distritos de Setúbal e Santarém, João Ferreira de Almeida aponta também para Pombal, no distrito de Leria, embora refira que este é um caso especial: na maioria são casas que têm até três idosos, já que o limite é quatro. Convém também distinguir os vários gradientes de lar ilegal: “há alguns casos que até teriam condições para serem legalizados e outros que são casas clandestinas, até custa chamar àquilo lar”.
Ao PÚBLICO, a vereadora da Acção Social da Câmara de Pombal, Ana Cabral, diz que não lhe chegou qualquer lista do ISS. Embora a autarquia saiba que existem “casas com dois ou mais idosos” e estando a fazer uma monitorização, não identificou qualquer “situação anormal”.

No Montijo, a situação é diferente. “Fomos com os bombeiros e com pessoas do ISS e procurámos fazer o levantamento desses lares ilegais e clandestinos. É que, às vezes, nem os próprios vizinhos sabem que vivem ao lado de lares”, afiança o presidente da Câmara do Montijo, Nuno Canta, antes de detalhar o cenário encontrado: “Foram detectados pelos bombeiros 20 lares nestas condições”.

Em Tomar, o crescimento do número conhecido não foi exponencial. À lista de oito lares ilegais, o trabalho da autarquia com o ISS e o auxílio de juntas de freguesia juntou mais três. “Fizemos vistoria a todos, para perceber se têm planos de contingência”, explica a vereadora do município com a pasta da Acção Social, Filipa Fernandes. Caso não tenham, a autarquia encaminha nesse sentido, refere. Terminada essa fase, Tomar está pronta para iniciar os testes a trabalhadores, diz a vereadora: “Primeiro começamos pelos funcionários e, se por acaso algum estiver [infectado], faz-se ao lar todo”. »

(1) Com Diogo Cardoso Oliveira e Patrícia Carvalho

Público 21.06.2020