Intervenção de Betâmio de Almeida, na sessão de apresentação do livro “O Economista Suave, Outra Vez” e debate sobre a situação económica do país, com o Prof. Dr. Pedro Lains

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Texto da intervenção de A. Betâmio de Almeida, na sessão pública de apresentação e debate, que a Apre! levou a efeito em Lisboa no dia 18 de Novembro, no Auditório da Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro, em Telheiras, com o economista Pedro Lains, sobre o seu livro “O Economista Suave, outra vez”.

1- Apresentação do autor

O nosso convidado de hoje é o Dr. Pedro Lains, autor do livro recentemente publicado “O Economista Suave (outra vez). Ensaios sobre Portugal e a Grande Recessão, 2008-2013”. 
O Dr Pedro Lains é licenciado e agregado em Economia pela Universidade Nova de Lisboa e doutorado em História pelo Instituto Universitário Europeu de Florença. 
É investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e 
Professor na Universidade Católica e na Universidade Nova de Lisboa. 
É autor ou co-autor de diversos livros, nomeadamente a História Económica de Portugal, publicado em 2011. 
É colaborador regular dos media e autor de um blogue. 
O seu mais recente livro que nos fez reunir esta tarde reflecte, com subtileza, o olhar de quem vê mais longe, com o conhecimento das situações do passado. Reflecte o olhar de quem sabe estabelecer o enquadramento histórico adequado na análise económica e política de cada presente. 
Realço a importância e o interesse da consideração da história da economia, a nível nacional e internacional. 
Lembrando uma frase de Churchill: 

“Na história residem todos os segredos da arte política”

E, também, esta citação muito conhecida, atribuída, por vezes, a Churchill mas que é, na verdade, da autoria do filósofo espanhol Georges Santayana (publicada em 1905): 

“Aqueles que não recordam o passado estão condenados a repeti-lo!”

Aproveito para citar Pedro Lains (p. 205 do livro em causa): 
A história económica serve para ir mais longe e encontrar causas dos problemas económicos não na política mas, em primeiro lugar , na economia“. 
Não ter em conta a experiência do passado constitui um factor relevante nas correntes dominantes contemporâneas da política económica. 
Na atribuição do doutoramento “honoris causa” na Universidade de Lisboa, o Nobel Paul Krugman sublinhou a falha de conhecimentos sobre a história da economia na formação e na actuação dos economistas de tendência liberal mais radical. Um factor de insucesso da política de austeridade na UE. 
2- O livro
O livro de Pedro Lains é baseado em 50 textos publicados pelo autor em diversos órgãos da comunicação social e outras publicações.São relativos à situação económica e política em Portugal, cobrindo o período de 2008 a 2013. 
Os textos estão agrupados de acordo com os seguintes cinco grandes tópicos: 
– O Labirinto do Resgate 
– Globalização 
– Europa 
– Economia sem Mestre 
– História de Crises 
Completa o livro um conjunto de três entrevistas muito interessantes. 
Este tipo de livro, baseado em textos publicados em diferentes épocas e contextos, tem, obviamente, um risco evidente: a eventual falta de consistência ou de coerência. Trata-se de um desafio decorrente da elevada exposição ao fluxo do tempo mas que o autor aceita corajosamente. 
Pedro Lains contorna esta dificuldade através do agrupamento temático referido e de uma sequência bem conseguida, não cronológica, dos textos. 
O resultado é positivo e o livro transfigura-se num apoio de fácil leitura e até de referência futura. Desperta interesse e é quase didáctica. 
Nem sempre os títulos dos livros têm uma ligação consistente com a obra. 
Neste caso, e sem conhecer as razões do autor para a escolha, tenho que dizer que a expressão “economista suave” é feliz: 
Para além de ser uma designação que seduz por ela própria traduz bem o estilo do autor. 
Nos últimos anos, a maioria dos economistas que falam para os cidadãos de Portugal não têm sido suaves, têm sido mesmos muito violentos, fazendo de supostas verdades únicas uma licença para atemorizar e, frequentemente, manipular com ideias simplórias. Sem sensibilidade social. Sem sensibilidade humana. 
Os reformados conhecem bem o que, recorda Pedro Lains (p. 49), foi dito: 
É preciso mudar de rumo, que vivíamos acima das possibilidades, que era preciso um corte radical com o passado“. 
Os textos do Dr. Pedro Lains são o contrário deste padrão. 
O autor explica e apresenta a sua opinião com uma autoridade serena, com a delicadeza de quem fala de algo que afecta a vida de milhões de compatriotas. O livro recorda-nos o nosso percurso histórico na dimensão económica e naquilo que nos compromete como povo. Mas também com a coragem de fazer antecipações e de, por vezes, expor-se aos factos futuros e aos erros de uma previsão. Escreve com respeito pelos cidadãos. Afinal, a Economia deve estar ao serviço destes e não o contrário. 
3- O conteúdo
De acordo com a minha leitura saliento os seguintes tópicos onde encontramos no livro matéria e análises sucintas com muito interesse para reflexão do leitor: 
A realidade portuguesa– o que somos, o que temos feito, as nossas limitações e as nossas ilusões. Reflexão a fazer: o que podemos fazer? Quais as expectativas que devemos ter no domínio sócio-económico? 
O contexto europeu e os condicionamentos externos, nomeadamente o problema do euro e da dívida. Reflexão a fazer: até onde pode Portugal aguentar este caminho, na democracia que conhecemos, sem uma rotura? Ou o que teria de mudar na Europa para viabilizar a situação de Portugal e proporcionar a sustentabilidade de um estado social justo? 
As crises, a história das crises, das mudanças dos sistemas económicos e a instabilidade do sistema financeiro mundial. Reflexão a fazer: podem, em democracia, os cidadãos encontrar alternativas, alterar o caminho do retrocesso de valores sociais, a mercantilização completa da humanidade, garantir um crescimento sustentável que garanta trabalho digno para os jovens, qualidade de vida e segurança nas pensões dos reformados? 
O Dr. Pedro Lains propõe respostas e avança com posições próprias que, frequentemente, são muito diferentes das ladainhas que muitos comentadores da área económica fazem. 

Exemplos? Eis algumas afirmações do autor seleccionadas de modo livre e não exaustivo: 

– “Há muitos modos de o dizer, mas na verdade o euro foi construído de forma incompleta. Por outras palavras, uma vasta zona económica que inclui Portugal…muito dificilmente se consegue adaptar à existência de uma moeda única” (p.78, em 2013). 
– “Portugal deverá acima de tudo aprender a viver melhor com a posição que lhe coube em sorte no mundo, isto é, um honroso lugar na cauda da lista dos países mais desenvolvidos” (p.113, em 2009). 
– “Portugal não pertence mas também nunca pertenceu às primeiras ligas europeias…Reconhecer isso serve para muito” (p.152, em 2009). 
– “Será então preciso deitar fora o nível de bem estar que se atingiu nos últimos 15 anos, de voltar à maior pobreza relativa de 1995? Teremos de abandonar os nossos desejos de ter um país mais igual, mais limpo, mais simpático? De acabar com o estado social?” (p.165, em 2011). 
– “A ideia de que a crise que atravessamos desde 2007 ou 2008 se deve apenas, ou sobretudo, à responsabilidade política carece de uma forte revisão, no que diz respeito a Portugal ou ao resto do mundo”(p.213, em 2012). 
Os textos incluídos no livro suscitam muitas e variadas perguntas. Deixo já duas questões ao Dr. Pedro Lains para abrir o debate: 
– A história económica mostra como cada situação concreta de um país é o resultado de factores e condicionamentos diversos com raízes no passado. É um processo relativamente complexo que não pode ser caracterizado de um modo simplista como alguns políticos e comentadores fazem e que a comunicação social divulga e uma parte da população aceita, por inércia, por ignorância. Como conciliar então esta cada vez maior interligação opaca de factores com uma participação informado do cidadão? 
– Em diferentes épocas históricas, a estruturação e condução das sociedades foi sendo inspirada por poderes dominantes especiais: a religião, o militarismo patriótico, uma ideologia, o institucionalismo jurídico, entre outros. 
No presente e numa parte do mundo, a Economia, os economistas têm um intervenção preponderante suportada numa teoria quase única e os mercados, os investidores e o capitalismo financeiro são quase tratados como entidades transcendentes. Os poderes políticos ficam submissos e impotentes. 
O Papa Francisco identificou “esta economia que mata”. Com efeito parece existir uma deriva de liquidação de valores humanos e de decência, através de uma mercantilização que tende a invadir todos os domínios, nomeadamente o privado e o simbólico. Esta vertigem de tudo poder ser objecto de compra ou de venda para onde pode levar esta civilização e a democracia? 
Para terminar esta breve apresentação, sublinho que os textos incluídos no livro do dr.Pedro Lains convidam a uma reflexão serena sobre assuntos importantes da nossa vida colectiva, do nosso país, e revelam a possibilidade de outras opiniões, de outras acções políticas. 
No meu entender, não existe uma única Economia como alguns querem fazer convencer os cidadãos, e o movimento chamado neo-liberal segue essa linha. Podem coexistir visões diferentes. O livro do dr Pedro Lains mostra que é possível pensar a Economia de um modo “suave” mas diferente de outros modos. 
A. Betâmio de Almeida
Membro da Direcção da APRe!