O factor ‘Apre!’

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O ponto de exclamação não é inocente. Com esse ponto, o acrónimo de Aposentados, Pensionistas e Reformados transforma-se numa interjeição que exprime espanto, irritação, impaciência ou repulsa. Tudo o que pretendem transmitir estes reformados, por se considerarem “o grupo escolhido para o massacre fiscal” do ‘ajustamento’. Nos dicionários da Porto Editora, ‘Apre!’ aparece com um significado ainda mais explícito: “Fora! Vai-te!”, invectiva que, para a associação em causa, tem como destinatário óbvio o Governo em funções.

Só por si, o nome da organização – “cívica, laica e apartidária”, como se declara nos estatutos, se bem que a sua presidente pertença agora à Comissão Nacional do PS – é todo um programa, cujo fim último consiste em mudar, ou, pelo menos, influenciar, as políticas que interessem aos reformados. Num país onde a vida pública com visibilidade e força mediáticas é dominada pelos partidos, a ‘Apre!’ tornou-se, em escassos dois anos, uma associação com voz e força na sociedade. Isso deve-se, não só aos sacrifícios impostos aos pensionistas, mas também à firmeza tranquila e à capacidade da sua líder, professora aposentada e ex-directora de uma escola pública de referência em Coimbra.

Os reformados, não correspondendo a um grupo social homogéneo, mas a um universo de grupos sociais muito diferenciados, apresentam-se como um imenso mercado eleitoral, com perto de 3,5 milhões de votos. Os partidos gostam de lhes agradar, especialmente aos mais desfavorecidos, em vésperas de lhes pedirem o voto. Houve até um que se propôs representá-los nos anos 1990, mas revelou-se um fracasso, como é provável que aconteça a outro formado recentemente com esse mesmo objectivo: o Partido Unido de Reformados e Pensionistas.

Já o aparecimento de associações deste tipo, quer se situem à esquerda, como a ‘Apre!’, quer noutras áreas políticas, deve ser encorajado porque estimula e enriquece o debate público.
Desde que não se comportem como meras extensões dos partidos ou se deixem dominar por eles, mal adquirem representação e notoriedade. Só assim terão influência real, não apenas na definição das políticas, mas também nos resultados eleitorais. O voto dos reformados vai pesar, e muito, na votação do próximo outono.

Fernando Madrinha
Opinião SOL 27/04/2015