A ASFIXIA DA CLASSE MÉDIA

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Passos Coelho acha que um primeiro-ministro governa um país como um chefe de família (seja lá isso o que for) governa uma casa. Ainda que os portugueses não sejam seus filhos e que Portugal não tenha nascido por obra sua. Vai daí, sentenciou que andámos todos a viver acima das nossas possibilidades e começou a tratar do assunto. Cortou-nos a mesada, passou-nos um responso e ensinou a quem quis aprender o caminho da redenção pelo sacrifício.

Para Passos Coelho a pobreza é bonita e honrada. O desemprego é uma oportunidade. A cultura é uma fantasia. Ele tem duas grandes ambições para os portugueses: pão e vinho – sobre a mesa. Uma sardinha, vá, nos dias de festa.

Assim, para o grande patriarca, sempre que as famílias portuguesas se põem com frivolidades como o sistema nacional de saúde ou o Estado de direito constitucional, já se estão a esticar. Comprar uma casa, ter um emprego estável ou tirar uma semana de férias, isso já será uma desonra equivalente a uma cuspidela nas bochechas rosadas da Sra. Merkel. Logo ela, que tanto dinheiro tirou do bolso dos contribuintes alemães para nos matar a fome – a nós, que mal merecemos o ar que respiramos.

Não será assim para todos, naturalmente. Há portugueses que podem ambicionar ao sucesso. E até à riqueza. Se estudarem muito, trabalharem e forem esforçados como, por exemplo, aquele senhor de apelido Loureiro que agora não me lembro bem o nome ou esse self made man de sorriso castiço, que dá pelo nome de Miguel Relvas. E aqui o grande patriarca já está, digamos assim, a educar pelo exemplo, o que também é bastante pedagógico.

Na verdade, para Passos, a asfixia da classe média não é uma medida de política económica, é uma premissa ideológica. E, nesse sentido, o programa da coligação é muito coerente. Passos vem apenas reiterar o que nunca se cansou de repetir. Devemos agradecer todos os dias, de mão estendida e de olhos no chão, o favor dos mercados e a generosidade dos credores. Devemos aprender a viver, resignada e habitualmente. E, vendo bem, talvez a própria democracia já esteja acima das nossas possibilidades.

https://afaltademelhor.wordpress.com/2015/08/03/terceiro-a-asfixia-da-classe-media/