Devíamos ser capazes de melhor

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Obrigado pelas pancadinhas nas costas, sr. Schäuble, mas nós devíamos ser capazes de melhor. Melhor taxa de desemprego, melhores índices de produtividade, uma qualquer reforma do Estado, melhores serviços públicos, mais rede social, menos “pecados”, enfim. Mas isso não. Nós somos é bons a pagar dívidas, nem que para o fazer precisemos de autorização.

É a política, não é, sr. Schäuble? É ela que o leva a enaltecer o exemplo do bom aluno em contraste com o ranhoso mal comportado lá do mar Egeu. Portugal, em conjunto com a Irlanda, é “a melhor prova” de que os programas funcionam, “e de forma mais eficaz do que muitos esperariam há quatro anos”, não foi o que disse?

Mas tem de ser a política que o leva a dizer isso, porque pela economia não pode mesmo falar. Não é só estar mau, é a perspetiva de que o que foi feito não deixa muitas perspetivas de que os milhares que partiram, e continuam a partir, possam vir a fazer as malas de volta.

E nem é só a economia, sr. Schäuble. É a sociedade mais cansada, mais desprotegida e, muito em especial, mais desigual. Já viu os últimos dados fresquinhos? Os funcionários públicos portugueses ganhavam em média em 2014 um valor semelhante a 2011. Todos? Não: os representantes do poder legislativo e os dirigentes de topo da Administração Pública ganham agora mais 8,7% e 2%, respetivamente, do que há três anos. Assim se constrói a desigualdade, assim se peca “contra a dignidade” de um país.

É a política, sr. Schäuble. A política que fez com que a escolha dos eleitores na Grécia fosse uma escolha contra si. A política que o faz estar em aliança natural com o Governo português, já que as suas vitórias no palco europeu, as vitórias da sua política, são as vitórias de Passos e Maria Luís. Por isso, os seus elogios em causa própria são o que são, política. Até porque, acima de tudo, sr. Schäuble, nós devíamos ser capazes de melhor.

David Pontes

Opinião JN 20.02.2015