O bom professor

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Atribuir classificações é uma missão muitas vezes difícil e ingrata. E quando o aluno tira uma negativa no teste, sujeita-se a ver na pauta uma nota de que não gosta. Mesmo que tenha acumulado serões de esforçado estudo, tenha seguido à risca o plano de recuperação traçado pelo professor e apresente trabalho de casa que comprove ter ido além do que lhe era exigido.

Depois de anos a conseguir uma positiva fraquinha graças ao empenho em ser um bom aluno, Portugal enfrenta agora nota negativa. O arrastamento da avaliação ao longo do tempo merece desde logo reservas. A dúvida pairou sobre a Península Ibérica durante meses. Parte da decisão deverá finalmente ser conhecida esta semana, já que a Comissão Europeia irá reunir-se para fixar o montante da sanção a aplicar, que pode ir até 0,2% do PIB (350 milhões de euros). Outra parte fica adiada para setembro. Só nessa altura haverá uma “solução equilibrada” sobre a eventualidade de serem suspensos alguns dos 16 fundos estruturais elegíveis no âmbito do regulamento das sanções.

O processo é inédito e tem dado azo a muita especulação e reação precipitada. A suspensão dos fundos foi dada como certa quando ainda não passa de um cenário e logo o primeiro-ministro veio acenar com a possibilidade de processar Bruxelas. Ao mesmo tempo que pediu “carinho”, no seu otimismo alinhado com o presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa, por sua vez, diz que quanto mais pensa na matéria “menos lógica” vê nas sanções.

Lógica é algo difícil de esperar neste processo, quando mesmo dentro de portas o tema é usado de forma instrumental e política. Passos Coelho invoca que as sanções só poderão ser um resultado da má governação atual. E parece não entender que esse é precisamente o pior sinal que poderia ser dado pela Comissão Europeia.

É verdade que Portugal tirou negativa, por ligeiras décimas. Mas também é verdade que o fez seguindo à risca um guião monitorizado pela troika. Ao assumir que o problema não são os resultados de 2015, mas o facto de haver um novo Governo que, em 2016, mudou a orientação e o discurso, Bruxelas está a dar um sinal intolerável de desconfiança e total condicionamento das políticas num Estado-membro. Está a agir como um professor que ao longo de meses ameaça um aluno, dizendo que só lança na pauta a nota do ano transato se ele se comprometer não apenas a tirar boa nota este ano, como a ter uma atitude mais submissa dentro da sala de aula.

O bom aluno depende muito da confiança que lhe merece o professor. Pena que este nem sempre se lembre de que também é avaliado.

Inês Cardoso