Por quem os sinos voltam a dobrar…

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A comunicação social é, em geral, muito lesta a apontar ‘culpados’, mas pouco dada a assumir as suas próprias responsabilidades

Menos de quatro meses depois da de Pedrógão Grande, a tragédia dos incêndios voltou a abater-se sobre o País, com avultada perda de vidas humanas. Que é o mais importante e dramático, mas não pode fazer esquecer as outras perdas – para as pessoas, patrimoniais e ambientais. Neste aspeto, e no simbólico, avulta o ter ardido cerca de 80% do “pinhal de Leiria”, o de D. Afonso III e D. Dinis, cuja madeira serviu para as caravelas dos Descobrimentos. Face a tal tragédia, suas causas e consequências, creio que o aqui escrito sobre Pedrógão (VISÃO de 29 de junho) mantém a atualidade e a pertinência. Mas como não o vou, obviamente, reproduzir, lembro apenas que o título era “Por quem os sinos dobram”; e por isso agora titulo “Por quem os sinos voltaram a dobrar…”. Por todos nós.

A prioridade absoluta volta a ser solucionar no concreto, e o mais possível no imediato, os dramas e problemas decorrentes da devastadora vaga de incêndios de domingo. Depois, em matéria de responsabilidades, há que apurar o que não foi feito, e o que devia, em termos de previsibilidade, e havia efetiva possibilidade de ter sido feito. Por exemplo: como todos os anos, chegado outubro, de acordo com o planeamento e com os contratos antes celebrados, os meios aéreos já eram muito reduzidos: teria sido possível ou não aumentá-los, quando se tornou previsível essa necessidade?

Prioridade absoluta é também preparar tudo para começar a executar, com urgência, como prometeu o primeiro-ministro, e sob uma direção firme e prestigiada, as propostas da Comissão Técnica Independente (CTI) nomeada pelo Parlamento. A Comissão realizou um excelente trabalho, que se impõe realçar, havendo desde já que mapear, com a sua colaboração, o ordenamento e o timing das ações a desenvolver. Sem ninguém esquecer o que por sua parte pode e deve fazer, nomeadamente a comunicação social. Em geral muito lesta a apontar “culpados”, os mais fáceis, e a ditar “sentenças”, mas pouco dada ou muito lenta a reconhecer as suas eventuais “culpas” e assumir as suas próprias responsabilidades.

Ora, o relatório da CTI sublinha, por exemplo, que em Portugal há “um elevadíssimo número de ignições”, seis vezes superior ao de Espanha e 19 vezes ao da Grécia!, 98% das quais com causa humana, em regra não criminosa – causa que, acrescento, terá sido decisiva na tragédia de domingo. E sublinha também que tal realidade se combate sobretudo através de esclarecimento e sensibilização (mas em 2017 foi diminuída a verba a esse feito destinada…), no que aos media cabe papel relevante. Assim, e não tenho visto citada esta parte do relatório, a Comissão propõe o envolvimento da “comunicação social, para que seja parte da solução em vez de ser parte do problema” (sublinhado meu). Para, por exemplo, “deixar de fomentar o mito do fogo posto e passar a contribuir para a prevenção de comportamentos de risco (…) com a produção de informação útil.” Mais, a CTI refere as “mensagens erradas indutoras de comportamentos perigosos” difundidas por televisões, e recorda, muito bem, os necessários contributos dos media para a “educação das populações urbanas ou rurais sobre as medidas a tomar para a autoproteção da sua integridade e dos seus bens”

José Carlos de Vasconcelos